A inteligência artificial está redesenhando o conceito de casa inteligente. Antes restrita a dispositivos conectados pela internet das coisas (IoT), a smart home agora incorpora eletrodomésticos capazes de aprender rotinas, otimizar recursos e tomar decisões por conta própria. Mas, na prática, essa inteligência embutida realmente melhora a experiência do consumidor?
A promessa é atraente: lavadoras que gastam menos água, aparelhos de ar-condicionado com consumo reduzido e fornos que ajustam automaticamente temperatura e tempo. Esse salto vem porque os eletrodomésticos passam a identificar padrões, registrar o comportamento dos usuários e ajustar seu funcionamento com base em múltiplos parâmetros captados por sensores — e não mais apenas cumprir rotinas pré-programadas.
Segundo Renato Franzin, pesquisador do Laboratório de Sistemas Integráveis e professor da Escola Politécnica da USP, a diferença entre automação simples e IA é justamente a capacidade de tomar decisões informadas por esses parâmetros. Em entrevista, ele citou o exemplo de um forno que reconhece o alimento colocado nele e sugere a temperatura e o tempo ideais. “Antes você tinha um parâmetro que era a temperatura. Agora você pode regular a temperatura e se a casca [do alimento] está mais dourada ou não, esse tipo de coisa, através de uma câmera. Essas possibilidades de agregar novos parâmetros no dia a dia desses eletros faz com que você tenha mais parâmetros para tomar decisões sobre o que está acontecendo lá dentro. E, na hora que você fala em tomar decisões, você pode usar alguma coisa mais sofisticada como a IA”, explicou.
Além de alterar como esses aparelhos são fabricados, a IA muda a relação do usuário com eles. Muitos processos de tentativa e erro — descobrir qual ciclo de lavagem evita que uma peça encolha, por exemplo — podem ser substituídos por sistemas que se autorregulam, reduzindo falhas e a necessidade de ajustes manuais.
O avanço da IA nos eletrodomésticos não surgiu do nada: foi viabilizado por três fatores principais apontados pelo pesquisador:
- miniaturização da eletrônica, com componentes que cabem em espaços reduzidos;
- sensores mais acessíveis, que permitiram medir novos parâmetros;
- reaproveitamento tecnológico, quando tecnologias que se tornam obsoletas tornam-se alternativas econômicas para uso em eletros, reduzindo o custo de hardware e software.
Fabricantes coreanos, como Samsung e LG, são vistos como pioneiros nesse movimento, especialmente por mirarem o mercado americano de alto consumo. No Brasil, porém, o preço desses eletrodomésticos ainda é elevado para grande parte da população. Além do custo, a popularização depende também da simplicidade de uso: “Não adianta nada você tirar 10 minutos de trabalho de você na máquina de lavar roupa e colocar 20 minutos para programar alguma coisa no celular para que aquela máquina funcione”, observa Renato.
Em suma, a IA promete transformar eletrodomésticos em dispositivos mais eficientes e autônomos, mas a adoção em massa seguirá condicionada ao equilíbrio entre custo, praticidade e real ganho de experiência para o usuário.