A Apple, conhecida por décadas de estabilidade em sua cúpula, vive neste ano a maior reestruturação executiva das últimas décadas. Nas últimas semanas, a empresa viu a saída — ou anúncios de aposentadoria — de nomes como John Giannandrea (chefe de IA), Jeff Williams (COO) e Alan Dye (Design). Entre rumores e análises, também circulam previsões de que Tim Cook pode deixar o cargo de CEO em 2026, enquanto colunistas dizem que o iOS 27 terá foco em novos recursos de IA.
Esse movimento intenso levanta a dúvida: trata-se de uma renovação natural ou de uma resposta à pressão por inovação? Especialistas consultados apontam que a resposta passa pela estratégia de Inteligência Artificial da Apple e pela preparação para uma possível sucessão de Cook.
Fator IA
A saída de John Giannandrea, vice‑presidente sênior de Aprendizado de Máquina e Estratégia de IA — que estava na função desde 2018 — é o sinal mais visível de que a Apple busca novos rumos. Giannandrea sai num momento em que a empresa é criticada por ficar atrás de rivais como Google e Microsoft na corrida pela IA generativa.
Segundo Adriana Frantz, diretora de pesquisa da TGT ISG, parte dessa movimentação se explica pelas dificuldades técnicas que a companhia vem enfrentando. "A plataforma Apple Intelligence entregou recursos abaixo do esperado, e o upgrade da assistente Siri, anunciado há mais de um ano, já foi reprogramado algumas vezes", avalia Frantz.
Para tentar recuperar terreno, a Apple também tem buscado talentos fora de casa. Recentemente, a empresa contratou Amar Subramanya, ex‑executivo que liderou a engenharia do Gemini no Google, para assumir a vice‑presidência de IA. Frantz ressalta que a guerra por profissionais no setor de IA é intensa: "A Apple perdeu funcionários para concorrentes, mas também recrutou executivos que vieram da Meta e do Google."
Mudança de DNA
Além das questões ligadas à IA, a reordenação da alta gestão sinaliza uma mudança mais profunda na cultura corporativa. Tim Cook, que completou 65 anos em novembro, é apontado como potencial candidato a deixar o cargo de CEO em 2026, e o mais cotado para sucedê‑lo seria John Ternus, atual vice‑presidente sênior de Engenharia de Hardware.
Essa troca representaria um deslocamento no perfil de liderança da empresa. Enquanto Cook é reconhecido pela excelência operacional e logística, Ternus traria um viés mais técnico. Para Cassio Pantaleoni, diretor de Artificial Intelligence Solutions & Strategy da Quality Digital, essa transição é necessária na era da IA: "Até então, o design dos produtos da Apple ditava as regras para a engenharia. Com o advento da IA Generativa, a exigência agora é que hardware, software e algoritmos componham um elemento único."
Pantaleoni reforça que a escolha por uma liderança técnica sugere que a estratégia de IA da Apple será ancorada em hardware proprietário e utilidade real, distanciando‑se do hype especulativo.
Reação do mercado
Mesmo com a saída de veteranos como Jeff Williams e com aposentadorias programadas de executivos como Kate Adams (Jurídico) e Lisa Jackson (Políticas Ambientais), o mercado financeiro segue relativamente tranquilo em relação à Apple. A empresa continua sendo a segunda mais valiosa do mundo, avaliada em mais de US$ 4 trilhões, com pouca variação nos últimos meses.
Para analistas, essa renovação é vista como preparo para o futuro. "Mais relevante do que o risco de uma bolha [da inteligência artificial] é a percepção do mercado sobre o ritmo de inovação da Apple", observa Adriana Frantz. Na visão de Pantaleoni, a transição para um perfil como o de John Ternus pode ser fundamental para destravar essa inovação: "Ternus representa um retorno ao DNA de engenharia e produto, vital para uma empresa que precisa justificar seu valor além da inércia dos serviços atuais."