Na última semana, pesquisadores liderados pela Escola de Medicina de Stanford divulgaram resultados promissores de um tratamento experimental contra diabetes tipo 1 em camundongos. Nos testes, a técnica alcançou eficácia máxima na prevenção da doença em animais pré-diabéticos e ainda conseguiu reverter totalmente o quadro em roedores que já apresentavam a condição instalada.
O trabalho foi publicado no periódico científico Journal of Clinical Investigation e tem entre seus autores Preksha Bhagchandani, pesquisadora do Departamento de Desenvolvimento Biológico da Escola de Medicina de Stanford.
### Em resumo
- Cientistas ligados à Escola de Medicina de Stanford desenvolveram um tratamento experimental que reverteu completamente a diabetes tipo 1 em ratos;
- A pesquisa ainda está em fase inicial, mas os autores esperam que, no futuro, a abordagem possa ser adaptada para uso em humanos.
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## O que é diabetes tipo 1?
A diabetes tipo 1 é uma doença autoimune. Nesse tipo de condição, o sistema imunológico deixa de reconhecer algumas células do próprio corpo como “amigas” e passa a atacá-las, gerando danos importantes à saúde.
No caso específico da diabetes tipo 1, o alvo são as chamadas células beta das ilhotas pancreáticas, responsáveis pela produção de insulina. A insulina, por sua vez, é o hormônio que permite que a glicose seja absorvida pelas células do organismo e convertida em energia.
Quando as células beta são destruídas, o corpo passa a ter grande dificuldade em lidar com a glicose: o açúcar no sangue se mantém elevado, as células ficam sem energia suficiente e se instala o quadro que conhecemos como diabetes tipo 1.
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## Como funciona o tratamento experimental?
Para enfrentar essa combinação de destruição das células beta e ataque autoimune, os pesquisadores adotaram uma estratégia híbrida.
Primeiro, eles transplantaram células saudáveis do sistema imunológico de um camundongo sem diabetes para um animal doente. Transplantes desse tipo já são conhecidos, mas existe um obstáculo importante: o organismo receptor pode continuar a atacar tanto as novas células quanto as ilhotas pancreáticas substituídas.
Para contornar esse problema, a equipe desenvolveu uma forma de “reiniciar” o sistema imunológico do camundongo doente antes e durante o processo. Esse “reset” teve o objetivo de fazer com que o sistema imune passasse a conviver de forma mais equilibrada com as células transplantadas, sem necessidade de medicamentos imunossupressores contínuos.
Segundo relato dos cientistas ao portal Science Alert, esse protocolo permitiu que os animais vivessem “em harmonia, sem a necessidade de medicamentos imunossupressores durante, pelo menos, quatro meses”.
### O que foi usado nesse “reinício” do sistema imune?
Para promover esse reset imunológico, os pesquisadores combinaram:
- um inibidor imunológico;
- baixas doses de radiação;
- anticorpos específicos.
Além disso, o tratamento incluiu o transplante das células das ilhotas pancreáticas do doador, associado ao uso de células-tronco, também provenientes do mesmo doador. A ideia foi não só repor as células que produzem insulina, mas também remodelar o sistema imunológico do receptor.
Seung K. Kim, um dos pesquisadores envolvidos e membro do Departamento de Desenvolvimento Biológico da Escola de Medicina de Stanford, explica que o objetivo foi criar um sistema imunológico híbrido:
> “Precisamos não apenas substituir as ilhotas que foram destruídas, mas também reiniciar o sistema imunológico do receptor para evitar que a destruição [das células das ilhotas] continue”.
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## Resultados em camundongos
Na prática, o tratamento híbrido mostrou dois efeitos importantes:
- reverteu o quadro de pré-diabetes em alguns camundongos;
- curou completamente outros animais que já eram totalmente diabéticos.
Um dado positivo adicional é que, embora as células transplantadas tenham apresentado uma leve inflamação inicial, elas não foram rejeitadas nem atacadas de forma intensa pelo sistema imunológico do camundongo que recebeu o transplante.
Diante desses achados, Seung K. Kim declarou:
> “Acreditamos que esta abordagem será transformadora para pessoas com diabetes tipo 1 ou outras doenças autoimunes, bem como para aqueles que precisam de transplantes de órgãos sólidos”.
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## Desafios até chegar aos humanos
Apesar do otimismo, os autores ressaltam que a pesquisa ainda é preliminar e que existem vários desafios a serem superados antes que o método possa ser testado em humanos.
Entre as limitações atuais, estão:
- As células do doador só podem ser obtidas após seu falecimento;
- As células-tronco e as ilhotas pancreáticas precisam vir do mesmo doador, o que restringe bastante a disponibilidade de material;
- Ainda não há definição clara da quantidade ideal de células necessária para que o procedimento tenha sucesso.
Os cientistas também buscam maneiras de recriar em laboratório esse conjunto de células, de forma artificial, e de garantir a sobrevivência dessas estruturas após o transplante para outro organismo. Essa etapa é considerada fundamental para que, no futuro, a técnica possa ser aplicada clinicamente.
O estudo, portanto, aponta uma possibilidade animadora para o tratamento da diabetes tipo 1, mas ainda está em um estágio que exige muitos testes e refinamentos antes de qualquer aplicação em pessoas.